Músicos arranhoenses
Quantas vezes não lhe sucede a si pensar que já conhece tudo? Sucede a qualquer um de nós! Mas a verdade é que há sempre muita coisa interessante e bonita de conhecer, ao virar da esquina duma qualquer pessoa.
Temos neste postal o exemplo duma história simples e comovedora: no início dos anos 50, um pai atento, reconhece o dom no filho e faz-lhe uma surpresa, oferece-lhe um acordeão.
Poderá parecer uma coisa trivial, mas nos anos 50 não era bem assim, os recursos em Arranhó eram modestos, e os pais eram (aparentemente) pouco dados a gestos de ternura. E eu lembro-me muito bem do pai desta história, o chamado António Assis ou Tóino Loura.
O que é certo é que o jovem António Raimundo Assis, tinha de facto um grande dom para a música, adorou a prenda recebida, e aplicou-se com afinco na aprendizagem do instrumento. E não foi uma coisa amadora, andou a estudar em Lisboa na famosa escola do professor e maestro Vitorino Buino Matono. Na sua turma de então faziam parte alguns dos que viriam a ser estrelas nacionais no acordeão.
Devemos assinalar aqui que Vitorino Matono é considerado o pai do acordeão de concerto em Portugal, tendo revolucionado o seu ensino, além de ser um compositor reconhecido. Em 2002, quando cessou funções como diretor pedagógico do Instituto de Música Vitorino Matono, recebeu um louvor público, publicado em Diário da República, onde o seu «mérito técnico e artístico» na «divulgação e valorização do acordeão nas suas vertentes popular e erudita» foi destacado.
O louvor reconheceu ainda «o prestigiado percurso na área da música» de Vitorino Matono, «que inclui a participação regular (de 1966 a 1997) no Troféu Mundial de Acordeão como membro do júri internacional, a criação de uma escola de ensino especializado da música, a didatização do ensino da música em geral e do acordeão em particular e a conquista de excelentes resultados por parte dos seus alunos em concursos internacionais de acordeão».
Conhecido o curriculum e prestígio do professor Matono podemos melhor apreciar a importância da sua opinião sobre o valor do seu aprendiz, expressa nos cartazes de promoção que mandou fazer para lançar o seu aluno: «Abrilhantado este baile pelo jovem acordeonista António Raimundo Assis, que não obstante ter começado os seus estudos em acordeon há muito pouco tempo, irá maravilhar o povo desta localidade com músicas de difícil execução onde mostrará a grande técnica que já possui e também modernos fadinhos e canções que acompanhará cm a sua voz melodiosa.»
Como vemos, palavras muito elogiosas de reconhecimento do professor Matono.
Em 1954, o jovem arranhoense começou a abrilhantar bailes por muitos lugares do concelho – Arranhó, Serra de Alrote, Louriceira, Arruda dos Vinhos – e também fora dele: Sevilheira, Aroil, etc.
Para a época, em que as deslocações eram bem difíceis e a vida das pessoas era modesta, foram bons tempos para esta jovem promessa arranhoense e a coisa durou alguns anos. Entretanto, o namoro levou-o a repensar o seu projeto de vida, e o acordeão foi guardado.
Os arranhoenses virão a ouvi-lo de novo no final dos anos 70, tocando desta vez órgão electrónico, quando do regresso da Orquestra Os Bem Entendidos, da qual fazia parte.
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© Direitos Reservados, Reprodução Proibida | Arranhó Memória e Gratidão, compilação e foto de José M. Ferreira Luiz