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Postal de Arranhó N° 019: “Estudo sobre o associativismo em Arranhó I”

Já tínhamos preparado e organizado uma exposição sobre o tema no salão do URDA nos anos 80.[1] Neste recente estudo procuramos estruturar tudo aquilo que pudemos entretanto apurar até ao momento sobre a história das dinâmicas associativas em Arranhó, [2] caracterizadas por uma persistente intenção de reagir ao isolamento e dureza da vida na região, melhorando as condições de vida e o convívio da comunidade arranhoense, sob o ideal do progresso e do bem comum.

Será porventura um trabalho inacabado, mas acreditamos indispensável para todos quantos se interessem pela rica história dos arranhoenses e da sua vida associativa. Oferecemos este estudo em memória de todos quantos construíram e viveram todos estes acontecimentos às gerações vindouras.

  1. A Arranhó do limiar do século XX
    Merece a pena fazer um breve enquadramento social e político da situação de Portugal naquela época, para melhor entender o ambiente da aldeia de Arranhó no limiar do século XX.
    As tentativas de expansão portuguesa em África provocaram colisões de interesses que culminaram no Ultimato inglês de 1890. Entretanto o sector de opinião pública republicana em Portugal vai-se ampliando, e as classes médias começam a identificar as suas aspirações de vida nova com a mudança de regime. As dissidências no interior dos partidos monárquicos dificultam imenso o prosseguimento da rotina rotativa obrigando o rei D. Carlos a tentar a via autoritária da ditadura do executivo. Mas o regime pôs termo a essa experiência e introduziu uma situação de crise institucional que acabou tendo, como é sabido, o seu epílogo na triunfante revolução republicana de 5 de Outubro de 1910.

Os objetivos dos republicanos – o alargamento das liberdades, a eliminação dos privilégios e maior justiça social -, criaram grandes expectativas, mas estiveram contudo longe de ser cumpridos. A tal não foram alheios factos como a permanente instabilidade política, a conflitualidade anti-clerical com a Igreja Católica, a insensata decisão da participação portuguesa na Grande Guerra de 1914-1918, a difícil conjuntura internacional, e, a permeabilidade do regime aos grupos de pressão internos.

Como é sabido, a crise interna da chamada 1ª República agravou o atraso económico e o atraso social generalizados conduzindo a um golpe de estado militar de características ditatoriais em 28 de Maio de 1926.
O novo regime – o Estado Novo -, entrou a aplicar com rigor uma política de saneamento económico acompanhada de autoritarismo de uns “safanões a tempo”, onde a “serenidade” e a paz social são conseguidas com o auxílio da censura, de polícias políticas, das proibições e restrições de todos os direitos dos cidadãos, designadamente da liberdade de expressão do pensamento, e, da liberdade de reunião e organização.

Ora, é neste quadro difícil e conturbado que vamos encontrar a aldeia de Arranhó na entrada do século XX. A sua população, conhece duras condições de vida face à crise e ao fraco desenvolvimento do País. Encontramos alguns abegãos,[3] regatões,[4] muitos jornaleiros,[5] e também artífices (sapateiros, ferrador, ferreiro, etc.).

É a época do candeeiro a azeite, dos grandes ranchos para a monda dos trigais ou da apanha da azeitona. É o tempo das cegadas e cantigas ao desafio, dos bailes animados com uma gaita de beiços, e dos cantadores ou improvisadores. É enfim o tempo das elevadíssimas taxas de analfabetismo: 97% em 1870 para 88% em 1930.

Notas;
[1] Luiz, José M. Ferreira | Guião da Exposição 60 Anos de Vida Associativa Organizada | manuscrito dactilografado | Arranhó, 1989.
[2] Luiz, José M. Ferreira | Estudo Sobre o Associativismo em Arranhó | original, 2023.
[3] Abegão, é o nome dado a um caseiro que tem a seu cargo a lavoura e a abegoaria de uma propriedade agrícola. Dá-se o nome de abegoaria à dependência onde se guardam o conjunto do gado e alfaias de uma propriedade agrícola.
[4] Regatão, é o nome dado a pessoas que se dedicam a negociar, a comerciantes.
[5] Dá-se o nome de Jornaleiro a trabalhadores rurais que trabalham ao dia, são pagos ao dia isto é à jorna.

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© Direitos Reservados, Reprodução Proibida | Arranhó Memória e Gratidão, compilação e foto de José M. Ferreira Luiz