Acreditamos que cultura independente dos arranhoenses assenta na sua localização geográfia territorial, e porventura foi muito reforçada pela instabilidade política e social criada pelos avanços e recuos na legislação administrativa nacional do séc. XIX.
Durante séculos a estrutura paroquial constituiu a estabilidade da identidade arranhoense. Mas o período de monarquia constitucional parlamentar, muito marcado pelas ideias liberais, conduziu a muitas iniciativas reformistas junto com muita instabilidade política e governativa. Não foi nada pacífica a remodelação institucional do País, reflexo dessa conturbada vida política nacional. [1]
Os arranhoenses viram-se naquela época envolvidos nas consequências duma disputa política que acabou afectando as suas vidas comuns, devido à chamada “dança dos concelhos”.
Tudo começou com a reforma administrativa de 1836 que veio remodelar os concelhos, criando uns, e extinguindo outros.
É sabido que estas mudanças mexem com as pessoas. Ora naquela altura o território de Arranhó ficou dividido por dois concelhos: 150 fogos para o de Arruda dos Vinhos, e 160 fogos para o de Sobral de Monte Agraço.
A documentação oficial disponível evidencia que a integração da freguesia de Arranhó no concelho de Arruda dos Vinhos não foi então pacífica e deixa antever uma relação complicada que durou mais de 60 anos.
Em 1867, ocorreu nova alteração na composição dos concelhos, e a paróquia eclesiástica de Arranhó viu-se incluida no concelho de Vila Franca de Xira.
Em 1868, voltou tudo à forma anterior.
Em 1874, foi criada uma nova divisão judicial e Arranhó passou a pertencer ao Julgado de Arruda na Comarca de Vila franca de Xira.
Em 1887, a sede do concelho de Arruda dos Vinhos foi transferida para o Sobral de Monte Agraço. Esta decisão foi muito contestada e criou animosidade entre as duas vilas.
Em 1890, foi restaurado o concelho de Arruda dos Vinhos englobando 5 freguesias, entre elas Arranhó.
É muito curioso registar a argumentação oficial usada na época pelos habitantes de Arranhó para contestarem a mudança: «nenhumas relações comerciais ou verdadeira comunidade de interesses existe entre os povos desta freguesia e os da vila de Arruda».
Em 1895, o concelho de Arruda dos Vinhos voltou a ser extinto, e a freguesia de Arranhó passou a integrar o concelho de Vila Franca de Xira.
Em 1898, o concelho de Arruda dos Vinhos voltou a ser restaurado, e a freguesia de Arranhó voltou a integrá-lo, até aos nossos dias.
As reformas admnistrativas ocorridas entre 1936 e 2013 versaram mais a ligação do concelho de Arruda dos Vinhos a diferentes modelos de regiões administrativas que se foram criando, mas já sem impacto directo na vida comum da população arranhoense.
Todo este histórico de mudanças criou certamente muitos incómodos aos arranhoenses, e também uma inusitada instabilidade sobre a quem e onde deviam dirigir-se para tratar dos seus assuntos.
Por outro lado, estas “pertenças” aqui e ali, também trouxeram aos arranhoenses uma mentalidade mais independente face aos poderes, e, o acolhimento de gostos e tradições próprias de outros concelhos a que pertenceram no passado.
Notas:
[1] Fátima Goulart, Administração Pública Portuguesa do século XIX: Roteiro para um breve percurso, dissertação de mestrado, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2020.
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© Direitos Reservados, Reprodução Proibida | Arranhó Memória e Gratidão, compilação e foto de José M. Ferreira Luiz