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Postal de Arranhó N° 161: “Sobre as profecias”

Também em Arranhó os antigos tiveram uma forma curiosa de transmissão oral de conhecimentos ao nível familiar: eram as chamadas “profecias”.

Lembro-me bem da minha mãe me contar que o seu avô paterno, o Francisco “Brincatudo”, insistir muito com ela para o ouvir com atenção e aprender algumas profecias de que ele tinha vasto reportório.

Ela, novita, não tinha muita paciência para as virtudes daquela tradição oral e, por essa razão, não dava muita atenção ao tema, mas fixou muitas das tais “profecias”.

Do que a minha mãe me contava só acabei por reter (infelizmente) uma que eu achava perturbadoura:
“Dias virão em que as estradas se encherão de luto, e os montes ligar-se-ão uns aos outros”.

E retive esta “profecia” porque desde o princípio me intrigou a sua formulação.

Estes nossos antigos patriarcas arranhoenses do tempo da monarquia, eram homens excepcionais e com uma sabedoria popular intensa.

É bom recordar que na época em que o meu bisavô falava, as estradas no nosso País eram em terra batida, muito poucas com o moderno macadame, e só alguns centros de vila apresentavam pavimento em calçada.

Naquele tempo, era muito comum nas pessoas mais velhas esta sabedoria transmitida oralmente, revestida de traços de mistério e alguma superstição; mas nos dias de hoje podemos interpretar melhor o seu sentido, e supor que apenas transmitiam um conhecimento adquirido algures nalgum jornal lido, ou ouvido a alguém mais instruído ou viajado.

O que é um facto, banal nos dias de hoje, é que realmente vemos e circulamos através de estradas e caminhos asfaltadas (o negro do alcatrão) e atravessamos magníficos viadutos rodoviários que encurtam distâncias e tornam as viagens muito mais cómodas e seguras.

Fica o registo desta curiosa, e entretanto perdida, forma popular de transmissão oral das “profecias,” que nos mostra o interesse em saber mais sobre o que se passava para lá dos horizontes limitados da pitoresca aldeia de Arranhó.
Hoje tenho pena de não ter dado mais atenção ao que a minha mão me procurava contar, e não ter memorizado mais desta curiosa tradição oral.

Notas:
Foto do Viaduto da A10 sobre o Vale do Loureiro, na Calhandriz.

#usoscostumes

© Direitos Reservados, Reprodução Proibida | Arranhó Memória e Gratidão, compilação e foto de José M. Ferreira Luiz